quarta-feira, março 29, 2006

poetas alentejanos - ANTÓNIO MACEDO PAPANÇA

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ANTÓNIO MACEDO PAPANÇA Conde de Monsaraz


Ao lermos a Musa Alentejana do Conde de Monsaraz são a terra e as gentes que se exprimem com determinação e sentido de hospitalidade. Podemos compreender, afinal, que o Alentejo se afirma como realidade viva, resistente e acolhedora.


Natural de Reguengos de Monsaraz, António de Macedo Papança (1852-1913), que viria a ser Conde de Monsaraz, filho de um abastado proprietário, foi Bacharel em leis, Deputado, Par do Reino, Sócio da Academia Real das Ciências, da Academia Brasileira de Letras, da Sociedade de Geografia de Lisboa e do Instituto de Coimbra, escritor e poeta.


Frequentou o ensino secundário na Escola Académica de Lisboa e, aos 17 anos, matriculou-se na Universidade de Coimbra, onde cursou a Faculdade de Direito, tomando grau de Bacharel aos 22 anos. Aquando estudante publicou um poema de forte pendor liberal e patriótico intitulado Avante, correspondendo a uma fase romântica da sua inspiração.


Tendo sofrido, ainda em Coimbra, a influência de João Penha, a sua poesia foi, em linhas gerais, moldada pela escola parnasiana, aliando uma grande preocupação formal com uma eloquência por vezes um tanto retórica, que atingiu momentos de certo dramatismo. A partir de dada altura, nota-se também uma outra influência, a de Cesário Verde, de quem, de resto foi amigo.


Num dos seus últimos livros, Musa Alentejana, transmitiu-nos toda a medida do seu talento: sensibilidade toda voltada para o exterior, sensual e optimista. Servindo-se de imagens naturalistas, descreveu minuciosamente a atmosfera própria da terra alentejana podendo integrar-se na corrente nacionalista do primeiro quartel do século XX, que, procurando fazer reviver o que designava como valores menos contaminados da nossa cultura, inspirou poetas como António Sardinha.


"É no fim da existência que ele se liberta das imposições canónicas do seu parnasianismo exigente e nos deixa na Musa Alentejana, não o testemunho duma sensibilidade, mas o hino de força, que é bem o pregão dum forte temperamento na posse de si mesmo", afirma exactamente Sardinha, no prefácio de Musa Alentejana.


De entre as suas obras destacam-se: Crepusculares, 1876; Catarina de Ataíde, 1880; Telas Históricas: I - O Grande Marquês, II - A Lenda do Jesuitismo, 1882; Obras de Macedo Papança, Conde de Monsaraz; Poesias, 1882-1891; Do último Romântico, Páginas Soltas [...], 1892; Benvinda (poema dramático em 5 actos), 1903; Musa Alentejana, l908; Lira de Outono, 1953; além de Obras (3 vols.), 1957-1958. Para o teatro traduziu diversas obras e colaborou em diversos jornais e revistas.


Ao entrar na vida política, filiou-se no Partido Progressista de Anselmo Braancamp e foi deputado em 1886. Em 1884, foi agraciado por El-Rei D. Luís com o título de Visconde de Monsaraz e em 1890, no começo do reinado de El-Rei D. Carlos, foi-lhe atribuído o título de Conde.


Tomou posse como Par do Reino a 17 de Março de 1898.


Em 1906 foi agraciado com a Comenda de S. Tiago de Espada e em 1907 com a Grã-Cruz de Afonso XII.


Após a proclamação da República, exilou-se com a Família em Paris. Regressou a Portugal na Primavera de 1913, tendo falecido a 17 de Julho, na sua casa de Lisboa e na véspera de completar sessenta e um anos.


Cultor da amizade juntou à sua volta personalidades de perfil e origem política muito diversos, como João de Deus Ramos, Luís de Almeida Braga, Laranjo Coelho, Augusto Casimiro ou João de Barros.

POEMA DO CONDE DE MONSARAZ
DEDICADO A MONTEMOR

“Entre escombros na rudeza
De vetusta fortaleza,
Batidas de vento agreste,
Empedrenidas, cerradas,
Há duas arcas pejadas
Uma de oiro outra de peste.

Ninguém sabe ao certo qual
Das duas arcas encerra,
O fecundo manacial
Que fartará de oiro a terra
Mesquinha de Portugal;
Ou qual, se mão imprudente
Lhe erguer a tampa funérea
Vomitará de repente
A fome, a febre, a miséria,
Que matarão toda a gente

Sempre que o povo faminto,
Maltrapilho e miserando
Fosse ele cristão ou moiro,
Entrou no tosco recinto,
Para salvar-se arrombando

A arca pejada de oiro
Quedou-se os braços erguidos,
O olhar atónito e errante,
Sem atinar de que lado
Vinha morrer-lhe aos ouvidos
Uma voz agonizante
Entre ameaças e gemidos.

“Ó povo de Montemor,
se estás mal, se és desgraçado
Suspende toma cuidado,
Que podes ficar pior!”
E nestas proplexidades
E eternas hesitações
Hão-de passar as idades,
Suceder-se as gerações
E continuar na rudeza,
Batidas de vento agreste,
Empedrenidas, cerradas,
As duas arcas pejadas,
Uma de oiro, outra de peste.”