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ESCOLAS DO CANTE – Os Carapinhas de Castro Verde
De
JOSÉ FRANCISCO COLAÇO GUERREIRO
Quando há quase duas décadas esboçámos o primeiro gesto para desenhar a ideia do que viria a ser o nosso grupo coral e etnográfico infantil, estávamos longe de imaginar que o nosso sonho continha tanta oportunidade e probabilidade de vingar.
Lidávamos então, com uma descrença constante acerca do futuro do cante ,forçado a declinar exausto pelo inexorável envelhecimento dos seus cantadores e pela nula renovação dos seus intérpretes. Os novos estavam ,ainda mais arredios do que agora, de qualquer ligação afectiva ou efectiva à moda. Tinha-se chegado ,nos meados da década de oitenta, ao nível mais baixo do crenço pelo cante, quase se desprezava o nosso modo de cantar, ninguém queria vestir a pele da identidade com uma tradição sempre conotada com o trabalho duro e com o suor amargo.
O cante é filho dos campos e das searas . Cresceu no coração dos rurais e impregnou a alma alentejana assumindo plenamente a sua poesia. Emprestou-lhe ,em troca, a sua sonoridade e o ritmo que alonga as sílabas como ecos que se arrastam e procuram chegar ao fim das planícies. Cheira a estevas, lembra lavouras custosas e restolhos curtos.
Deste estigma fogem os aculturados,filhos e netos de ganhões ,agora portadores de outras referencias.
Por isso, o nosso folclore , embora por nós muito querido em abstracto , é também de todos os outros, o menos assumido na realidade, por razões de índole sócio-cultural inconfessáveis mas indisfarçáveis.
Se indagarmos a proveniência sócio-económica e social dos membros dos ranchos folclóricos existentes no país, constata-se uma grande heterogeneidade de origens, ao passo que nos corais, nos nossos grupos , só milita ,por via de regra, gente com uma relação actual ou passada com o trabalho rural.
Confrange-nos ,por isso, a circunstância de num panorama como o actual, em que em termos laborais o peso dos serviços ser tão grande ,ser tão diminuto, em termos culturais, o envolvimento dos seus agentes na dinâmica da interpretação da nossa expressão vocal mais autentica.
Era tempo de se exorcizarem os estigmas e os preconceitos fazendo deslizar o cante para o campo da cultura, tornando a sua interpretação como factor de dignificação e de enriquecimento daqueles que podem fazê-lo.
Era já tempo de se acabar com tanta rejeição à moda, e altura de se entender que por se ser cantador não nos caem os parentes na lama, qualquer que seja os nosso mister.
Pelo contrário, é um gesto de entendimento e de inteligência já que nos interliga com referencias ,marcas e valores que importa abraçar em nome de um reforço da nossa identidade e da busca de um referencial colectivo que precisamos ter.
Mas para que se consiga tornear o actual torpor das mentes, julgamos que o caminho adequado è a criação de escolas do cante que tenham por embrião quaisquer associações e como seus dinamizadores actuais mestres da moda.
Foi assim que procedemos há quase duas décadas, quando em Castro Verde criámos os Carapinhas . Pela nossa escola já passaram centenas de crianças que agora,já adultos , alguns ainda cantam e outros poderão voltar a fazê-lo mais tarde.Mas mesmo que nunca cheguem a integrar grupos corais,conforta-nos a certeza de que a sua atitude face à moda será sempre de grande proximidade e nunca de rejeição ou de aviltamento como por vezes, neste mesmo Alentejo, lamentamos