domingo, junho 15, 2008

POETAS ALENTEJANOS - ADA TAVARES

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HOJE HÁ PÃO ALENTEJANO?

Esta frase tão ouvida
neste tom interrogado
não é sentença perdida
nem um pregão inventado,
nem dito voando à toa ...

Oh senhores, mas quem diria
que eu ia ouvir isto um dia
aos balcões de Padaria
desta moderna Lisboa?!

"Hoje há pão alentejano?!"

E se o empregado diz:
-"Olhe, acabou de chegar."

ri a freguesa feliz
e estende o saco apressada
pois não vá ele acabar ...

e pede firme, sem graças,
que não pode haver engano:
-
"Ponha-me aí dez carcaças
e um pão alentejano".

Ai é vê-lo meus amigos,
este pão que era só nosso,
o nosso Bem de raiz,
sem pretensões, sem ganância,
como ganhou importância,
- como ganhou um País.
Todos o querem agora,
por inteiro ... uma fatia ...
umas migalhas ... um naco ...
Pão nosso de toda a hora
que é farinha doutro saco.

Venham vê-lo na Taberna
ou no fundo duma Adega
como alegra o camponês:
-ensopa o copo de três
-abafa raios e coriscos
-faz de cama prós petiscos ...
e aconchegada a barriga
logo a voz se faz cantiga,
põe-se o Sol, vai-se a fadiga
que a noite mal começou,
e...
'às quatro da madrugada
um passarinho cantou..."

Ó pão do meu Alentejo
que bela lição tu deste
na tua nobre humildade,
e como tu aprendeste
a usar fraternidade.?

E sem briga, e sem guerra,
sem essa confusão louca,
deste nome à nossa terra,
levaste-a de boca em boca...

Pois também vai a banquetes
e a solenes beberetes
nas salas bem afamadas,
posto assim em pedacinhos,
feito "tapas" e "entradas',
regado com os melhores vinhos.

É o mais requisitado,
pedido por encomenda,
e vai em naperons de renda
até à mão de ministros.

E deu no goto a estrangeiros
e a certos senhores bem vistos
que o acham uma riqueza
e o querem na sua mesa ...

Não se recusa a ninguém,
dá-se a ricos, pobrezinhos,
a crianças e a velhinhos
e aos doentes também.

Pão de Paz ! Pão de Alegria !
Pão de Amor! Pão de Verdade !
É como nós neste dia,
uma mistura sadia
de renovo e de saudade.

"Hoje há Pão Alentejano?"

Esta frase tão ouvida
este tom interrogado
não é sentença perdida
nem um pregão inventado.
Nem dito voando à toa ...

Ó senhores, mas quem diria
que eu ia ouvir isto um dia
aos balcões de padaria
desta moderna Lisboa?

Que vitória meus amigos,
este pão que era só nosso,
o nosso bem de raiz,
sem pretensões, sem ganância,

- Como ganhou importância,
como ganhou um país!

ADA TAVARES


ADA TAVARES nasceu em ODEMIRA (Baixo Alentejo) PORTUGAL em 06 / 11 / 1930, donde saíu com a família na adolescência, tendo-se fixado em FEIJÓ- ALMADA.

- Começou aos 17 anos a publicar os seus poemas e pequenos ensaios de prosa em vários Jornais Regionais.

- Em 1960 teve quatro poemas musicados e gravados em disco(em canção ligeira) que tiveram o seu êxito na altura: Canção das Horas, Contas são Contas, De Porta em Porta, etc.

- Entretanto publicou os seguintes livros de Poesia:

“Voz do Povo é Voz de Deus”
“O Alentejo em Mim”
“Poesia a Cinco Vozes I “ - Colectânea
“Poesia a Cinco Vozes II” -

“Intervalo entre MIM e EU” - (Sonetos) a sair em breve

“Participação em muitas Antologias de várias Associações e Tertúlias Poéticas.

“Vários prémios em Jogos Florais

“Várias intervenções em Programas de Rádio.