SÁBADO, 13 DE ABRIL NA IGREJA DE
SANTO ILDEFONSO EM ALMODÔVAR
...A igreja de Santo Ildefonso, matriz de Almodôvar, recebe no próximo sábado, dia 13, abertura da 9.ª edição do Festival Terras sem Sombra. Este ano, a temporada musical promovida pelo Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja estende-se até 13 de Julho e é consagrada à polifonia. O arranque faz-se com um título promissor, Arquitecturas do Espírito, que evoca uma das marcas distintivas do FTSS: associar os mais belos monumentos religiosos do Alentejo meridional às grandes páginas da música sacra, antiga e contemporânea, através da interpretação de alguns dos melhores intérpretes da actualidade, nacionais e estrangeiros. Raquel Alão, soprano portuguesa, e Marifé Nogales, mezzosoprano espanhola, duas vozes já reconhecidas nos palcos europeus, e o Concerto Moderno, orquestra de cordas dirigida por César Viana, trazem à alma mater almodoverense um programa de excepção: o Adagio e Fuga, K. 546, de W. A. Mozart, o Requiem de Takemitsu, e o Stabat Mater, de Pergolesi. Três momentos fulgurantes da evolução da tradição polifónica na música ocidental que partilham de uma raiz espiritual comum, a meditação sobre o sentido da vida e da morte, realidade que cruza transversalmente a consciência europeia e, além dos seus ressaibos éticos e religiosos, tem uma dimensão artística profundíssima.
O Terras sem Sombra, concebido como uma “pequena História da Música”, é um festival de histórias. Algo que os artistas e os espectadores gostam de partilhar e saborear. Nesta óptica, o Stabat Mater constitui uma verdadeira referência. De facto, poucos se mostrarão insensíveis à sua beleza profundamente comovedora. Menos conhecidas, porém, são as circunstâncias em que surgiu tal obra-prima. Giovanni Battista Pergolesi, famoso compositor de Nápoles, escreveu-a em 1736, por encomenda da Confraternità dei Cavalieri di San Luigi di Palazzo, dessa cidade. O autor, apenas com 26 anos de idade, encontrava-se já gravemente afectado pela tuberculose, a recolhera-se à protecção do convento franciscano de Pozzuoli, na esperança de melhorar um pouco a saúde. Porém, os cuidados dos frades não foram suficientes para atenuar a fatalidade da doença fatal e Pergolesi dedicou os últimos dias da sua curta existência, quase agonizante, a este Stabat – um impressionante hino de fé na vida.
Mozart nasceu 20 anos após a morte de Pergolesi, mas continuou, com brilhantismo, as tradições do Barroco. Ignoram-se as razões que o levaram a escrever o Adagio e Fuga em dó menor, mas é bastante claro que o contacto com a música italiana exerceria forte influência na sua composição. As duas partes da peça – o Adagio e a Fuga – foram escritas em alturas diferentes. A Fuga data de 1783 e foi pensada originalmente para dois pianos (K. 426), num estilo deliberadamente arcaico. Mais tarde, em 1788, provavelmente para uma das sessões em casa do seu amigo barão van Swieten, adaptou a mesma Fuga a quarteto de cordas e juntou-lhe o Adagio. O conjunto assim formado conta-se entre as obras mais sérias e intensas de Mozart.
Entre Wofgang Amadeus e Pergolesi, o concerto de Almodôvar destaca um grande mestre do século XX, o período mais multifacetado da história da música. O japonês Toru Takemitsu foi um dos compositores que apostou no diálogo entre as heranças musicais do Oriente e do Ocidente. Autodidata, estava em posição para observar de forma distanciada e repensar o conjunto de influências da música ocidental que o marcaram, dos impressionistas franceses a Stravinksy, Webern ou Cage. Não pretendeu nunca moldar uma cultura musical à outra, ou misturá-las, mas encontrar uma essência comum às ambas, capaz de elevar a condição humana. O Requiem para orquestra de cordas, escrito em 1957, trouxe-lhe o reconhecimento internacional. O título é elucidativo. A obra puramente instrumental surge imbuída de uma melancolia imensa e avança através da cuidada gestão da textura, harmonia e cor, mas sem temas distintos. Apesar da densidade sonora, este Requiem é, em toda a sua tragédia leve, impalpável, como a dor.
Músicos associam-se à comunidade local para salvaguardar a biodiversidade
A primeira acção de sensibilização ambiental promovida pelo Festival em 2013 centra-se na biodiversidade da ribeira do Vascão e está ligada às comemorações do Ano Internacional de Cooperação pela Água, em colaboração com o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e a Associação de Apicultores do Parque Natural do Vale do Guadiana. No domingo de manhã, às 10h30, os artistas “descem do palco” e juntam-se à comunidade local, para um encontro marcado junto ao curso fluvial. A acção visa a conservação dos ecossistemas ribeirinhos deste importante afluente do Guadiana, recentemente classificada como Sítio RAMSAR – Zona Húmida de Importância Internacional. Reveste-se, pois, de valor, sendo o ponto alto as acções de pesca direccionadas para as espécies exóticas (principal ameaça dos ecossistemas ribeirinhos), de modo a preservar o equilíbrio de uma importante fronteira natural entre o Alentejo e o Algarve.
Sendo a apicultura uma das actividades com maior expressão económica na região, os participantes poderão ainda contactar com esta actividade, que tem, neste território serrano, características excepcionais, vinculadas à diversidade e à qualidade da flora, e cujo produto final é o tão conhecido mel de Almodôvar. Para os mais corajosos será promovida a visita a um apiário próximo da ribeira, de modo a conhecerem, de perto, os meandros de uma actividade ancestral, confiada tradicionalmente à tutela de Santo Ambrósio, o padroeiro dos apicultores. Também o pão, os enchidos, e as ervas aromáticas serão lembrados, havendo ocasião para a degustação de todos estes produtos regionais.