quarta-feira, outubro 23, 2013

CANTE A DESPIQUE E BALDÃO NA FEIRA DE CASTRO

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É DA TRADIÇÃO, HÁ JÁ LONGOS ANOS,
QUE NA NOITE DE SÁBADO DA FEIRA
DE CASTRO,O CANTE AO DESPIQUE E
AO BALDÃO, TEM LUGAR,E JUNTA À
VOLTA DA MESA CANTADORES E VIOLAS
CAMPANIÇAS.


Vêm da planicie, os campaniços, e da serra ,os serrenhos, e depois de um lauto jantar bem alentejano, bem regado, os tocadores sacam das campaniças,
fazen tanger as suas cordas, e os cantadores lançam para o ar s suas provocações o famoso despique, sempre pela ordem contrária aos ponteiros do relógio. Depois, de algumas voltas bem animadas, vem o baldão, com regras bem mais rígidas, a que só alguns conseguem corresponder em pleno.



Mas ouçamos um pouco ,o que nos diz o grande obreiro pela vivificação do baldão por estas bandas, e responsável desde o inicio da inclusão deste evento na programação da Feira de Castro, o José Francisco Colaço Guerreiro, da Cortiçol:


"Nos finais do ano de 1986, altura em que era capaz de jurar a pés juntos de que no panorama etno-musical da região baixo-alentejana nada mais já existia, com vitalidade digna de realce, do que o canto às vozes também conhecido por “cante” ou “moda”, tive conhecimento da existência, na Estação de Ourique, de um tocador e cantador que me disseram saber interpretar algo diferente daquilo que por cá se usava.

Foi assim que conheci, ouvindo cantar e tocar uma viola campaniça, o sr. Francisco António. Gravei, para divulgação na Rádio Castrense, uns quantos temas que pelo motivo da surpresa, pela autenticidade e pela excelência das peças, geraram em mim um enorme sentido de inquietação dada a responsabilidade que passava, a partir daquele momento, a ter entre mãos.

No mesmo dia, conheci também, na Funcheira, o sr. Manuel Bento e a D. Perpétua, que abrindo-me as portas, interpretaram mais meia dúzia de modas, deixando-me rendido e desde logo empenhado na promoção e na salvaguarda daquilo a que o José Alberto Sardinha chamou, com grande propriedade, “o outro Alentejo”. De facto, era e é o outro Alentejo que à data quase todos desconheciam e outros tantos tinham já esquecido.

No regresso a casa gizei formas de podermos, na Cortiçol, dar algum alento a esta realidade que era, obviamente, uma preciosidade cultural. A partir daí e até agora, pelo menos todas as quintas-feiras, na Rádio Castrense ouve-se tocar a viola campaniça, que através de parcerias e empenhos variados, voltou a ser construída entre nós e tocada por dedos jovens, deixando de ser um instrumento ignorado, descordoado e coberto de pó, só tocado ocasionalmente por dois ou três velhos mestres no isolamento de quatro paredes.

Mas não tardou em termos na estrada, correndo mundo e levando a campaniça e o encanto dos seus cantares a plateias primeiro curiosas e depois rendidas, desde os auditórios da Gulbenkian, em Lisboa, ao Teatro Carlos Alberto, no Porto, dos Açores ao Canadá, o “Grupo de Violas Campaniças” estruturado no âmbito da Cortiçol.

Por esta via, conheci também, pouco mais tarde, na Aldeia das Amoreiras, o sr. António José Bernardo, um talento, um homem para quem nada na sua vida estava à frente do canto de baldão, mas que infelizmente a morte levou cedo demais, deixando-nos ficar um imenso vazio. Foi ele, precisamente, quem me proporcionou no Verão de 1987 uma tarde inesquecível de espanto, de comoção e de grande admiração, quando me convidou para assistir em sua casa a um cante de baldão, organizado e oferecido às tensas de uma filha sua ter concluído o curso do magistério primário. De lá trouxe um novo desafio, que era tudo fazer para que o cante de baldão deixasse de ser só um pretexto para uns quantos cantadores se juntarem, de quando em vez e quase às escondidas, em exercícios de poesia repentista.

Foi através do programa “Património” que passámos a divulgar todos os cantos de baldão a que assistíamos e gravávamos, fazendo renascer o gosto generalizado por esta prática, ao ponto de passarem a ser os próprios cantadores a telefonarem, para divulgarmos em directo as suas cantigas. Ainda agora assim acontece.
Também, porque era necessário dar corpo, vitalidade e promover o empenho dos cantadores e dos tocadores de campaniça, a Cortiçol, com o apoio do Município, todos os anos, pela Feira de Castro, organiza um encontro e homenageia um dos artistas, escolhido pelos seus pares. E já se passaram vinte e muitos anos…"(...)



Este ano a noite do DESPIQUE E BALDÃO, realizou-se no Forum Municipal , e não numa taberna como ´é costume e mais do agrado dos cantadores,pois é esse o seu espaço natural, onde nasceu e onde se sentem melhor.

A noite começou de forma auspiciosa, com os jovens alunos de viola campaniça da Escola Secundária de Castro Verde ,



nessa noite com a presença entre eles do seu primeiro professor, o nosso amigo Paulo Colaço, que se mostrou muito feliz e comovido por este regresso a Castro Verde e o contacto com os seus jovens ex-alunos.



É já muito evidente o crescimento deste grupo de jovens ,cuja qualidade e quantidade , garante desde já , o futuro da viola campaniça.


Foi então a vez do Despique e Baldão.

Como já aqui tenho dito em crónicas anteriores, todos os anos os cantadores, durante o repasto e antes de iniciarem a função, escolhem por votação um companheiro de entre eles, para ser homenageado no ano seguinte, na Feira de Castro.

O ano passado tinham votado no companheiro Joaquim José Francisco ,o SOBREIRAL.

E foi ele ,o poeta popular e cantador homenageado que começou por endereçar as primeiras palavras de agradecimento


As duas primeiras voltas foram como de costume de cante ao despique, cantado à capela, sem campaniça, e iniciadas pelo homenageado


com resposta do Manuel Graça



e outros




depois do despique veio o Baldão, agora já acompanhado à viola campaniça pelos alunos da Secundária de Castro Verde






Estes exertos são só uma pequena amostra, pois o Baldão cantou-se até tarde da noite e quando as vozes já começavam a faltar.

Para o ano que vem teremos de novo o Despique e Baldão, e o homenageado escolhido para o ano 2014 foi o poeta popular e cantador de baldão MANUEL GRAÇA.